Saltar para: Post [1], Pesquisa e Arquivos [2]

A LUCERNA

Entre o passado e o presente...a aldeia sonha!

03.Dez.18

A lenda de Santa Bárbara de Nicomédia

santa barbara 1.jpg

 

Santa Bárbara de Nicomédia, uma virgem e mártir do século III comemorada como santa cristã na Igreja Católica Apostólica Romana e também na Igreja Ortodoxa. É precisamente sobre este tema que vai incidir este capítulo.

De norte a sul, não há vila ou freguesia que não venere e celebre a sua imagem religiosa, santa ou santo da terra, geralmente a padroeira ou padroeiro. Neste género de festejos são recorrentes as romarias e procissões, as antigas tradições que muitas vezes misturam o profano com o religioso e, claro está, os cantares e orações que os tempos idos nos deixaram. Estas fervorosas devoções acabam por estar intimamente ligadas com a identidade das suas respetivas terras mas, em Santa Bárbara de Padrões, a situação atinge um outro patamar visto ser claramente possível estabelecer uma ligação entre o orago e praticamente todos os restantes fatores caraterizadores da Freguesa, o que significa que a figura de Bárbara de Nicomédia acaba por ser mesmo o eixo central da antiga Arannis e, assim, assumir um caráter primordial neste leque de elementos que visam definir a essência de Santa Bárbara de Padrões.

 É importante referir que não existem certezas de que a existência e história de Santa Bárbara é verídica, algo que é extremamente recorrente com os santos dos primeiros séculos do cristianismo. Aquilo que se sabe sobre a vida de Santa Bárbara é de origem lendária. O Padre António Vieira, considerado o Imperador da Língua Portuguesa, dedicou um sermão à Virgem Santa de Nicomédia e refere-se a ela da seguinte forma:

“Tinha Santa Bárbara, como filha única e herdeira de Dióscoro, seu pai, senhor nobilíssimo da cidade de Nicomédia, um riquíssimo património dos bens que chamam da fortuna. Tinha mais outro mais precioso e mais rico, que era o de todos os dotes da natureza e graça, formosura, discrição, honestidade, e as demais virtudes por onde o desejo e emulação de todos os grandes a procu­ravam por esposa. E tendo já consagrado tudo isto a Deus na flor da idade, até a liberdade e a vida lhe sacrificou a sua fé e o seu amor: a liberdade em um dilatado martírio, presa por muito tempo e aferrolhada em um castelo, e a vida em outro martírio, mais breve, mas muito mais cruel, sendo variamente atormentada com todos os géneros de tiranias, e, finalmente, degolada com a maior de todas, por mão de seu próprio pai.”

De forma breve e baseando-me no livro da Editorial Missões dedicado a Santa Bárbara, da autoria do Pe. Januário dos Santos, é possível afirmar que Bárbara foi,  uma jovem que nasceu na antiga Nicomédia (que corresponde, atualmente, à cidade de Izmit na Turquia), filha de um nobre e poderoso sátrapa de seu nome Dióscoro. A referida Santa tinha uma “rara beleza” e era muito disputada pelos homens da época que a pretendiam como esposa precisamente por ser muito rica, bela e por dispôr de um conjunto de virtudes que o Padre António Vieira enumera no excerto acima.

Dióscoro não queria deixar a sua única filha viver no meio da sociedade corrupta daquele tempo. Por esse motivo, decidiu fechá-la numa torre. Onde ela era educada por tutores da confiança de seu pai. Do alto da sua torre ela contemplou as maravilhas da natureza como o sol, a chuva, as aves e as estações do ano. Tudo isso contribuiu para que Bárbara se questionasse se aquilo era realmente obra dos “deuses” da mitologia romana ou de outro “alguém”.

Assim, é possível, desde logo, afirmar que a história de Santa Bárbara está intimamente ligada com a aprendizagem, a descoberta interior e com o encanto perante os deslumbramentos da natureza.

Santa Bárbara começou depois a frequentar a cidade para conseguir arranjar um pretendente do agrado do pai mas, nessas visitas, acabou por conhecer cristãos e por assimilar os princípios do Cristianismo. Bárbara conseguiu ser batizada por um sacerdote vindo da Alexandria e, como tal, por assimilar o mistério da Santíssima Trindade.

Bárbara, na sua torre, durante um período de ausência do pai, mandou construir três janelas de forma a lembrar a santíssima trindade e ordenou que fosse esculpida uma cruz na parede a recordar a Paixão de Jesus. O seu pai quando descobriu as atitudes da filha e quando percebeu que ela estava irredutível na sua decisão de ser cristã, denunciou-a, fazendo com que esta fosse torturada de forma extremamente violenta na cidade. Porém, Bárbara, optou por se manter fiel aos seus princípios, revelando-se uma jovem de força e coragem. Sofreu, posteriormente, uma série de tormentos até ser decapitada pelo próprio pai no cume de uma montanha. De seguida, Dióscoro foi atingido, violentamente, por um raio.

Esta é apenas uma das versões da Lenda de Santa Bárbara, existem outras versões que relatam que a Virgem tentou fugir, escondendo-se numa fraga que se abriu miraculosamente, acabando por ser protegida por uns mineiros que lá se encontravam.

A Lenda de Santa Bárbara e as histórias em torno da vida da Santa Padroeira acabaram por se tornar, também, temas correntes na cultura popular desta freguesia que vê especificamente, nesta Santa, um exemplo e uma inspiração, a quem se recorre para pedir auxílio e proteção.

O culto a Santa Bárbara terá nascido no Oriente e terá chegado ao Ocidente até ao século XV, principalmente na Alemanha com a devoção aos catorze santos auxiliares, onde apenas constam três santas mulheres: Santa Bárbara, Santa Catarina (de Alexandria) e Santa Margarida (de Antioquia). Estes santos auxiliares tinham como principal função proteger contra diversas doenças e foi durante o período da peste negra que estes foram mais invocados.

Ainda que a sua posição estivesse secundarizada em detrimento de outras virgens mártires como Santa Luzia, Santa Inês ou Santa Cecília o poder intercessor da Santa e a sua afirmação enquanto padroeira de várias corporações contribuíram naturalmente para a proliferação do seu culto, como tão bem testemunham certos provérbios populares de todos conhecidos.

Santa Bárbara é, assim, uma das santas mais populares e invocadas no nosso país, sendo protetora contra “relâmpagos e tempestades” e, ainda, padroeira dos mineiros, artilheiros, bombeiros, pirotécnicos e de outras profissões relacionadas com a construção da torre onde foi aprisionada (cabouqueiros, pedreiros e arquitetos) bem como quanto à sua utilização (presos e guardas prisionais).